Nossa região enfrenta uma agenda antidireitos e um movimento fundamentalista que busca frear, e em muitos casos retroceder, o reconhecimento de nossos direitos sexuais, reprodutivos e não reprodutivos. Em muitos de nossos países, chefes de Estado, congressos e senados foram influenciados por movimentos conservadores e informações falsas, estereótipos e campanhas de difamação que conseguiram impor a sua visão na legislação estatal.
Este movimento conservador não avança com a sua agenda, pois se depara com a força e resistência do movimento feminista da região. Organizações, redes, coletivos e ativistas resistem ante o avanço da direita conservadora. De maneira organizada conseguem que os direitos humanos e o poder de decidir sobre os corpos e a sexualidade se tornem realidade, além das imposições do Estado.
Na região andina, organizações feministas responderam com várias estratégias às reformas legislativas que se relacionavam com o direito ao aborto das pessoas com possibilidade de gestar. A partir dos nossos Apoios de Resposta Rápida (ARRs) contribuímos para que iniciativas e campanhas cheias de conhecimento e resistência se realizem. Apresentamos duas delas:
Por intermédio do Acórdão nº 34-19-IN/21, o Tribunal Constitucional do Equador descriminalizou o aborto em caso de estupro e determinou à Assembleia Nacional que regulasse o procedimento para a interrupção da gravidez. A lei foi promulgada em 29 de abril de 2022 e a ela foram incorporadas mais limitações para o acesso ao aborto em casos de estupro. O acesso ao procedimento de interrupção da gravidez em casos de estupro é obstaculizado pelo estabelecimento de um prazo gestacional para o aborto.
Diante disso, a organização Empute EC solicitou um ARR para realizar uma ação de litígio estratégico perante o Tribunal Constitucional do Equador para que se declare a inconstitucionalidade da "Ley Orgánica para la Interrupción Voluntaria del Embarazo en Caso de Violación" (Lei Orgânica para a Interrupção Voluntária da Gravidez em Caso de Estupro). Porque ela põe em risco não só a dignidade das meninas, adolescentes, mulheres em todas as suas diversidades e pessoas com possibilidade de gestar, em especial as mais precarizadas, mas também coloca em risco a segurança física e jurídica destas pessoas.
O objetivo desta ação é acabar com a criminalização das pessoas que decidem abortar para que elas não sejam revitimizadas quando necessitam solicitar o serviço após sofrer um estupro; para que não tenham que pagar pelos custos judiciais; e possam abortar em centros de saúde pública perto de suas residências, especialmente nas zonas rurais. No Equador já existem mulheres criminalizadas ao realizar o aborto por decisão própria e, inclusive, por emergências obstétricas.
As ações que a organização realizou conseguiram fazer com que esse assunto e a rejeição à legislação aprovada continuem na agenda pública e que mais pessoas tenham informações que lhes permitam acessar seus direitos.
La Mesa por la Vida y la Salud de las Mujeres (A Mesa pela Vida e Saúde das Mulheres) - Colômbia
Após a decisão histórica de 21 de fevereiro (Acórdão C-055 de 2022) que descriminalizou o aborto na Colômbia até a 24ª semana de gestação e manteve vigente o modelo de casos, foram apresentadas duas iniciativas de referendo que buscam modificar a Constituição Política colombiana reconhecendo a vida desde a concepção e, com isso, restringindo o direito ao aborto no país. Estas iniciativas representam um risco não só para a vigência do Acórdão C-055 de 2022, mas também uma ameaça para a descriminalização social do aborto, valendo-se de plataformas religiosas e políticas para atacar a autonomia reprodutiva das pessoas com a possibilidade de gestar que instalam um cenário político de maior confronto para es ativistas.
A Mesa pela Vida e Saúde das Mulheres, através do movimento Causa Justa, decidiu trabalhar a partir de quatro frentes de ação: a primeira é a implementação e o fortalecimento dos serviços, aliada à formulação de uma política pública integral sobre os Direitos Sexuais e Reprodutivos. A segunda é proteger a decisão na cena política e legal, considerando a proteção das defensoras do direito ao aborto como um assunto prioritário. A terceira é a descriminalização social do aborto, criando ambientes de legitimidade frente às decisões das mulheres e pessoas com capacidade de gestar. E a quarta frente de ação é o fortalecimento do movimento, priorizando o seu crescimento e gerando um equilíbrio com o respeito e a visibilidade das organizações que fazem parte da articulação.
As organizações que integram o grupo de comunicações do Causa Justa realizaram oficinas de criação e construção coletiva para implementar ações estratégicas com o objetivo de: ampliar as informações sobre o novo marco (legal, social e cultural) do aborto na Colômbia; aumentar a quantidade de pessoas a favor do aborto na opinião pública; sustentar a conversa pública em novos termos; incrementar a participação de vozes no território; e gerar ações comunicativas que contribuam com o posicionamento do movimento Causa Justa como referência nacional e internacional.