Resistências ancestrais hondurenhas: abraçando a proteção dos corpos-territórios

25 Fevereiro 2019

De 21 a 25 de janeiro, acompanhamos a Missão Feminista de Solidariedade "El Abrazo", a cargo da Iniciativa Mesoamericana de Defensoras dos Direitos Humanos e da Rede Nacional de Defensoras de Honduras, a fim de ACUERPAR suas resistências. Éramos 52 mulheres ativistas, de 13 países, unidas para colocar, no centro dessa missão, o CUIDADO, a espiritualidade e o compromisso político, com as diversas iniciativas de mulheres e feministas que fazem frente ao avanço dos fundamentalismos políticos e religiosos.

As políticas repressivas do Estado hondurenho, a monopolização da terra nas mãos de poucos, as perseguições, a criminalização, a repressão, a violência das forças militares e as ameaças constantes das empresas que pretendem acabar com os bens comuns são algumas das realidades com as quais nos deparamos nessa visita.

Estivemos em seis municípios do país, onde as empresas extrativistas, em alianças com o governo, colocaram em risco os territórios e os bens comuns e instauraram mecanismos violentos para acabar com os espaços de participação e decisão das organizações de mulheres defensoras. De acordo com a organização Front Line Defenders, Honduras é um dos países mais perigosos da América Latina para pessoas que defendem os direitos humanos, principalmente o direito à terra.

Em meio ao atual contexto político, as defensoras seguem juntas, defendendo a natureza, seus corpos e suas vidas, com o medo latente de serem assassinadas ou de terem que fugir, como muitas fizeram nas três últimas caravanas de migrantes. Além disso, elas resistem à violência existente em algumas organizações mistas, por questionarem lideranças que, historicamente, sempre pertenceram aos homens. Em outras palavras, elas não apenas enfrentam a violência própria do modelo extrativista, do capitalismo e do racismo, como também a violência estrutural do patriarcado, que atravessa todos os seus espaços.

Durante a jornada, várias defensoras compartilharam alternativas criativas, espirituais e rebeldes para defender seus corpos-territórios. Por exemplo, na comunidade Garífuna, no município de Tocoa, a espiritualidade é a melhor forma de proteção para elas; a ancestralidade está presente no centro de suas lutas, é a força de seus ancestrais que as leva a defender a mãe terra e a vida.

Conversamos com algumas mulheres garífunas, guardiãs e protetoras dos direitos coletivos e membros da OFRANEH (Organização Fraterna Negra Hondurenha), que
desde 1978 assumiram o compromisso de trabalhar pelos direitos culturais e territoriais, apesar de serem perseguidas pelo atual governo de Jorge Hernández.

"A Ofraneh é a organização defensora dos direitos do povo garífuna e também do povo indígena. A 'Ofra' tem programas que trabalham com as mulheres; temos também a Associação de Mulheres. Trabalhamos com a juventude e defendemos os direitos das pessoas LGBTI. A Ofraneh enfrenta o patriarcado existente e o Estado, a quem não convém que a Ofraneh exista, pois é ela quem luta pelo direito do povo garífuna", Aurelia Arzu, subcoordenadora da OFRANEH.

Também presente é a força daquelas mulheres assassinadas por exigirem uma vida digna e livre de violência em seus territórios, como Berta Cáceres, que deixou seu legado para muitas mulheres no país. Juana Esquivel, diretora da Fundación San Alonso Rodríguez que foi vítima de campanhas de difamação por seu trabalho como defensora dos direitos humanos, garante que:

"Sentimos e compartilhamos a coragem de muitas companheiras, daquelas que defenderam no passado e das que hoje resistem. Assim, defendemos nossos corpos, territórios, rios e montanhas; sem perder a alegria e o amor pela vida, que é a maior revolução diante desse sistema patriarcal, machista e capitalista. Grande parte da força que me mantém na luta vem da resistência e da coragem de minhas companheiras, elas são minha voz e eu sou a voz delas, onde quer que estejamos."

O território hondurenho tem paisagens repletas de rios maravilhosos e montanhas verdes, vítimas do saque e da violência de um modelo capitalista e extrativista voraz. Fomos testemunhas da repressão e da vigilância sob as quais as mulheres precisam viver em seus territórios por parte das forças militares, que controlam algumas áreas em concessões de exploração. Por exemplo, quando visitamos o rio Guapinol, que é uma fonte principal de água para a região, 15 homens das forças militares nos intimidaram com sua presença por cerca de duas horas, atrapalhando a tranquilidade da atividade preparada pelas mulheres dessa comunidade. Essa fonte hídrica está em risco de desaparecimento, além de outros rios do departamento de Colón, devido à exploração mineira da empresa Inversiones Los Pinares.

"Defender a água e os bens comuns é defender a vida de todos e de todas", gritaram as mulheres em uníssono em frente ao rio Guapinol.

O medo está presente, é sentido em todos os lugares, mas não é maior do que a força das mulheres hondurenhas para enfrentar esse panorama de vigilância e violência sistemáticas contra defensores, ativistas e organizações de direitos humanos. Essa visita fez florescer ainda mais a rebeldia das mulheres, que nos reafirmaram que a união as fortalece, que a defesa dos bens comuns as mantém unidas e que, acima
de tudo, continuarão levantando suas vozes por uma vida digna e justa, por um mundo sem exploração de seus corpos-territórios.

Ao finalizarmos a Missão, nós, as organizações participantes, reiteramos nosso compromisso com a situação das mulheres hondurenhas, ABRAÇANDO cada uma de suas resistências, nos unindo à força de suas vozes para falar ao mundo sobre essas situações que se tornaram invisíveis, exigindo do estado de Honduras o fim da violência sistemática contra mulheres defensoras, suas comunidades e seus territórios.


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